segunda-feira, 14 de junho de 2010

Tema: Traição


Amizade Infernal

O Rui nascera num bairro popular, onde habitavam ladrões e polícias, e por isso hesitou durante muitos anos que lado haveria de escolher. Como ladrão seria o maior, o mais provocador, o mais inspirado. Como polícia seria o mais criativo, o mais inovador, o mais inspirador. Vivia assim numa tensão, num conflito, num desespero, na dor. Parecia que o céu inteiro se juntara para o tramar. Ele sabia que o desastre era inevitável, que acabaria por chegar até que o tempo o apagasse da memória. Teve meditações viscerais sobre a natureza da violência urbana, lembrou-se do gang de adolescentes aparentemente fraternais, quando não estavam a lutar uns contra os outros. Se optasse pela polícia, que grau de traição seria? Não queria trair os amigos, mas por outro lado esse respeito impunha-lhe a sua submissão. Sentiu uma tensão e o sentido da ameaça, viu pesadelos no horizonte com criaturas sinistras, era uma luta entre o real e a fantasia. Não tinha aprendido a ser autêntico. O trapézio onde se encontrava não tinha rede. Estava a ir longe de mais para quem já tinha testemunhado o pior. Nunca poderia fingir ser o que não era.



Sem comentários:

Enviar um comentário