domingo, 27 de junho de 2010

Tema: Sexualidade

O Beijo


O tema atormentava-a. Afinal o quotidiano não era assim tão normal como pensava, e o beijinho que dera na boca do Flávio, um rapaz alto, robusto e simpático, numa tarde de chuva num canto qualquer, depois do vigésimo olhar, com o reflexo dos pensamentos na ponta das línguas, que se enrolaram com fúria, deixou saudades do que não teve e do que não foi. Ela tinha-lhe posto os braços sobre ele, e nos olhos de ambos brilhara a mesma luz fixa. Não houve tempo para a sedução e a conversa. Viu-se longe, de perfil, na imaginação que tinha de si, grávida e só. Zulmira estava triste e contente, suspensa no seu alheamento, esquecida do tempo e de si própria, impessoal. A paixão tinha sido bela, simples e frágil. A vida afinal era mais imprecisa do que parecia. Zulmira vibrou e tremeu como os pássaros antes de gritarem, correu sem tempo e sem fôlego, enterrando os pés na terra cansada de chuva. No seu rosto havia uma fixação, uma obsessão. Escutou um susto. Era o despertador.




Sem comentários:

Enviar um comentário