sexta-feira, 30 de abril de 2010

Tema - o Fado


Fama Celeste

Cantava em tom maior, em fado corrido depois de dar sete voltas à língua. A sua voz, dorida e que vinha do fundo, era a sua fala. Estava sujo. Recebia obscenidades, injúrias e insultos. Fora assim desde tenra idade. O seu lamento era tão negro mas tão belo. Estava derrotado e desaparecido, tudo morria um pouco nele. Almas silenciosas de olhos cerrados seguiam-no continuamente na penumbra da vastidão vazia. Quis o destino que o comboio onde sempre cantara fosse o seu carrasco, num dia de neblina espessa. Sentiu uma rajada de ar fresco.
– Foi por vontade de Deus!
Descobriu então que tinha uma vasta legião de admiradores, Ninfas, Sereias, Musas, Anjos, e tantos outros.
– Aqui, tens o Mundo como palco.
O Céu tem lógicas cuja razão parece não poder ser exactamente determinada, foi por isso que o fado representou o lado mais irónico da sua vida. O dedilhar das cordas de uma guitarra portuguesa começou a ecoar pelo templo...


terça-feira, 27 de abril de 2010

Tema: O Desejo


Cupido

É o mais agressivo e minimal dos demónios, acabando sempre por gerar tanto amores como ódios. Ele encara o “desejo” de uma forma espontânea. O Cupido tem acesso às mais negras visões do amor e aos subterrâneos onde estão guardadas as paixões nocturnas e os seres mal-amados. É uma espécie de jardim de emoções. O seu ninho mostrava a alegria da cor. Pediu para esperarem um pouco, fazendo sinal com o braço. Estava na parte final de uma corrida de lagartos, sentado numa cadeira e olhando para um tronco.
– Sou um viciado nestes jogos, que me distraem do trabalho inacabado por Lilith.
Tinha uma voz suave e meiga.
– Antes Lilith criava as verdades, como o “Amor”, mas agora apareceram outros pretendentes com criativas controvérsias e novas “paixões” – continuou, ajeitando um dos corredores que se tinha despistado. – Lilith começou a exportar a intolerância, não tem ilusões sobre as fraquezas, as demências e os crimes do desejo. O seu optimismo assenta no facto de ela ser capaz de criar o sublime. A minha deusa fechou-se e tornou-se previsível. Foi por isto que Deus preferiu dar a Adão, Eva!