Cantava em tom maior, em fado corrido depois de dar sete voltas à língua. A sua voz, dorida e que vinha do fundo, era a sua fala. Estava sujo. Recebia obscenidades, injúrias e insultos. Fora assim desde tenra idade. O seu lamento era tão negro mas tão belo. Estava derrotado e desaparecido, tudo morria um pouco nele. Almas silenciosas de olhos cerrados seguiam-no continuamente na penumbra da vastidão vazia. Quis o destino que o comboio onde sempre cantara fosse o seu carrasco, num dia de neblina espessa. Sentiu uma rajada de ar fresco.
– Foi por vontade de Deus!
Descobriu então que tinha uma vasta legião de admiradores, Ninfas, Sereias, Musas, Anjos, e tantos outros.
– Aqui, tens o Mundo como palco.
O Céu tem lógicas cuja razão parece não poder ser exactamente determinada, foi por isso que o fado representou o lado mais irónico da sua vida. O dedilhar das cordas de uma guitarra portuguesa começou a ecoar pelo templo...