quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Tema: Imagem


Espelho Meu

Quando a Vera estava em frente a um espelho comunicava mais pelos gestos do que pelas palavras. Ele era a porta de entrada do seu espírito sonhador. Deixava de ser a adulta que se governava pela ditadura do real, passando a reger-se pelos jogos do imaginário. Tossiu, para aclarar a voz, saudou a imagem para lhe conquistar a confiança e deixou sair uma ampla indignação exclamada de impropérios e gritos, que quase quebrava o espelho. Para ela o mais importante era voltar as costas à realidade. Conseguia assim conciliar as exigências contraditórias do sonho e da vida, mergulhando a fundo nas suas memórias, ilusórias miragens de felicidade. Às vezes fazia caras baças, outra vez caras brutas, às vezes a voz era rouca, outras vezes sobre-humana. Sabia que era capaz de grandes afeições, mas também de enormes raivas e ressentimentos, e isso assustava-a. Teve sonhos pequenos, um pouco mais longos, de novo pequenos. Era só em casa que os construía.

Sem comentários:

Enviar um comentário