terça-feira, 4 de maio de 2010

Tema - Superstição

O Anjo da Guarda


Maria contava que tinha tido uma experiência mística na adolescência, que a marcara para toda a vida: um encontro imediato com Mefistófeles. Só que a história ficava sempre pela metade e a parte do charro nunca mencionava. Era agora uma sofrida mulher de negro, com uma silhueta atípica, senhora de uma voz sem paz e de um medo profundo por um gato preto vadio, que escolhera por residência um buraco no telhado do prédio devoluto vizinho, resvés com a varanda do seu quarto. Maria guardava uma cautelosa distância do felino, que todas as madrugadas miava junto à roupa estendida. Mas uma noite acordou sobressaltada com o desespero do gato a bater-lhe freneticamente na janela de guilhotina, ao mesmo tempo que gritava desesperado. Sentiu pavor e deslumbramento. Pavor do fogo que se aproximava vindo da porta do quarto e deslumbramento por aquele gato preto que tanto temia, tudo isto acompanhado por memórias sensoriais da infância. Diante dos dois seres vivos desenrolou-se uma comédia indecifrável, que os contaminou e tornou a dissociação dos dois impossível de fazer. Nasceu assim um amor belo de ir às lágrimas, a preto e branco, milagroso, que teve a força dos acontecimentos.

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